REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS
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RELATÓRIO DE OUTRAS AÇÕES
DE CONTROLO N.º 3/2024 – 2ªS/PL

CLIMATESCANNER – AVALIAÇÃO
DAS AÇÕES GOVERNAMENTAIS
RELACIONADAS COM AS ALTERAÇÕES
CLIMÁTICAS

2024-11-14
Processo n.º 2/2024 – OAC

Relator: Conselheira Helena Abreu Lopes
*“com declaração de voto”

 

DESCRITORES

ACOMPANHAMENTO DA EXECUÇÃO / MEDIDAS ESPECIAIS DE CONTRATAÇÃO PÚBLICA / REGIME EXCECIONAL.
 

SUMÁRIO

  1. O Tribunal de Contas de Portugal participou no projeto ClimateScanner, uma iniciativa proposta pelo Tribunal de Contas da União do Brasil, na qualidade de presidente da INTOSAI, em colaboração com o respetivo Grupo de Trabalho para a Auditoria Ambiental (INTOSAI WGEA). Participaram na iniciativa, em 2024, 141 Instituições Superiores de Controlo (ISCs) em todo o mundo, que se comprometeram a promover uma avaliação global das ações governamentais relacionadas com as alterações climáticas.

  2. A avaliação das ações governamentais implementadas em Portugal para fazer face às alterações climáticas, de acordo com a metodologia acordada, foi efetuada em vários componentes, exprimindo-se os respetivos resultados na figura seguinte, numa escala de forças e desafios:


  3. O resultado das avaliações, assentes nos critérios acordados no âmbito do projeto, foi, na generalidade das componentes, muito positivo.

  4. A avaliação quantitativa encontra-se refletida na figura seguinte:

Eixo da Governança

  1. O Eixo da Governança obtém uma classificação de 86%, destacando-se o desempenho nas componentes relativas ao Enquadramento Legal e Regulamentar, à Estrutura de Governo, à Estratégia de Longo Prazo, à Gestão de Risco, ao Envolvimento das Partes Interessadas e à Transparência, atingindo todas estas componentes uma avaliação de 100%. Como constituindo um desafio, foi identificada a componente relativa à Inclusão, com uma avaliação de apenas 11%.

  2. No que respeita ao quadro legal e regulamentar, a Lei de Bases do Clima estabelece os objetivos e princípios da política climática, os direitos e deveres climáticos, a governação da política climática, os instrumentos de planeamento e avaliação, os instrumentos económicos e financeiros e os instrumentos de política setorial climática. Prevê que os procedimentos legislativos devem considerar o impacto das iniciativas no equilíbrio climático; especifica quais os princípios orçamentais e fiscais verdes que devem ser considerados como diretrizes em matéria de clima e que a dotação orçamental para fins de política climática deve ser consolidada na conta do Orçamento do Estado.

  3. As responsabilidades dos organismos públicos relativamente às alterações climáticas estão claramente definidas na lei. Não se identificaram lacunas e, apesar de existirem entidades com competências repartidas, não se identificaram impactos negativos.

  4. A contribuição nacionalmente determinada (NDC) de Portugal para o Acordo de Paris, que se enquadra na da União Europeia, foi apresentada em março de 2015 e atualizada em conformidade com o artigo 4.º do Acordo de Paris (dezembro de 2020, outubro de 2023). O compromisso de alcançar a neutralidade climática até 2025 está estabelecido na contribuição nacionalmente determinada e nas leis nacionais, em conformidade com o referido artigo 4.º.

  5. Portugal apresentou o Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2025 no âmbito da Convenção Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas a 20 de setembro de 2019, como a sua estratégia de desenvolvimento a longo prazo com baixas emissões de Gases com Efeito de Estufa (GEE), tendo sido identificados os principais vetores de descarbonização em todos os setores da economia, bem como as medidas e a forma de reduzir as emissões para os alcançar. Este Roteiro, atualmente em revisão para se alinhar com o reforço da ambição FIT for 55, cujos compromissos estão estabelecidos na NDC da UE, considera também o compromisso de antecipar o objetivo de neutralidade climática de 2050 para 2045.

  6. Portugal mapeou os riscos e vulnerabilidades associadas aos impactos das alterações climáticas, utilizando informação científica. A Avaliação Nacional de Riscos, atualizada em 2023, identifica e caracteriza os perigos suscetíveis de afetar o país, e os riscos climáticos são incorporados nos instrumentos de planeamento e nos instrumentos de gestão territorial (secas, escassez de água, incêndios rurais, erosão e inundações costeiras). O Orçamento do Estado também faz referência a alguns riscos climáticos.

  7. As políticas públicas climáticas estão sujeitas ao princípio da participação, incluindo os cidadãos e as associações ambientais no planeamento, na tomada de decisões e na sua avaliação. Na revisão do PNEC 2030, fomentou-se a participação institucional e cívica e a cooperação das entidades que representam os diferentes interesses setoriais.

  8. Portugal tem mecanismos de transparência que fornecem informações atualizadas sobre o progresso do cumprimento dos objetivos nacionais referentes às alterações climáticas, existindo sistemas, relatórios e sítios web que fornecem informações para acompanhar os progressos realizados na consecução dos objetivos nacionais sobre vários temas relacionados com a ação climática, incluindo os objetivos e compromissos internacionais assumidos. A informação está disponível ao público, de modo compreensível, no portal da Agência Portuguesa do Ambiente, I.P. e no Portal da Ação Climática.

  9. No que respeita à componente da Inclusão, as políticas de adaptação baseiam-se numa análise dos riscos e vulnerabilidades, mas que não individualiza explicitamente grupos vulneráveis.

Eixo das Políticas Públicas

  1. O Eixo do ClimateScanner com melhor desempenho foi obtido nas Políticas Públicas, com uma avaliação de 87%, destacando-se o resultado na componente relativa aos Planos Nacionais de Adaptação, que atingiu os 100%, sendo a avaliação mais baixa, com 78%, a da componente da Estratégia de Mitigação, não se evidenciando componentes identificadas como desafios.

  2. Os principais documentos estratégicos a nível nacional relacionados com a Adaptação às Alterações Climáticas são a Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas, o Programa de Ação para a Adaptação às Alterações Climáticas e a Lei Portuguesa do Clima. Em particular, esta determina a elaboração de importantes instrumentos de planeamento estratégico e operacional (como o desenvolvimento de planos de adaptação setoriais e de planos de ação climática municipais e regionais), institui processos adicionais de monitorização e comunicação, incluindo a criação de um Portal da Ação Climática, e prevê a integração de riscos climáticos na tomada de decisões de instituições e agentes públicos e privados, incluindo a avaliação de impacto legislativo climático.

  3. A execução da Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas é realizada através de grupos de trabalho setoriais e por áreas temáticas, e identifica 10 setores prioritários: Agricultura; Biodiversidade; Economia; Energia; Florestas; Saúde; Segurança de Pessoas e Bens; Transportes e Comunicações; Zonas Costeiras e Mar; e Recursos Hídricos.

  4. No que respeita à componente Estratégia de Mitigação, os objetivos e a respetiva estratégia para atingir os compromissos assumidos a nível nacional em relação à redução das emissões de Gases com Efeito de Estufa encontram-se refletidos no Roteiro para a Neutralidade Climática e no Plano Nacional Energia e Clima 2023 (PNEC 2030). No entanto, a elaboração de planos setoriais de mitigação coerentes com os objetivos setoriais e instrumentos de planeamento para a mitigação ainda se encontra em preparação, tendo já sido definidos os vários setores, de forma consistentes com o PNEC 2030.

Eixo do Financiamento

  1. O Eixo do Financiamento é aquele cuja pontuação é mais reduzida, com 63%. Dentro deste Eixo, a componente referente ao Financiamento Climático Internacional obtém o melhor desempenho (89%) e a componente relativa aos Mecanismos de Financiamento Climático Nacional e Internacional tem a avaliação menos positiva (33%), não se identificando, todavia, nenhuma das componentes como constituindo um desafio.

  2. A avaliação deste Eixo permitiu concluir que Portugal está empenhado em contribuir para o objetivo coletivo de mobilizar 100 mil milhões de dólares por ano para a ação climática nos países em desenvolvimento, afetando recursos ao financiamento internacional do clima. A afetação de recursos tem tido alguma oscilação ao longo do tempo, mas verifica-se uma tendência crescente de ajuda pública ao desenvolvimento na área relacionada com o clima. Os apoios decorrem das orientações políticas definidas na Estratégia da Cooperação Portuguesa 2030, que é o instrumento orientador de política nacional em matéria de cooperação para o desenvolvimento.

  3. Relativamente aos Mecanismos de Financiamento Climático Nacional e Internacional, especificamente no que respeita à mobilização do financiamento climático privado, conclui-se que não existe um levantamento das alternativas possíveis para o financiamento privado, nem uma sistematização eficaz para efeitos de monitorização e comunicação. Salienta-se, no entanto, que em 2019 foi criado o Grupo de Reflexão para as Finanças Sustentáveis, que promove a criação de produtos financeiros, com o envolvimento do setor público e do setor privado (blended finance), inspirados nas oportunidades decorrentes do Portugal InvestEU.

  4. O reporte e partilha de informações sobre financiamento climático privado é uma matéria que se encontra ainda em estudo, não existindo relatórios publicados.

Boa Prática – cessação da produção de eletricidade a partir de carvão

  1. Alinhado com os objetivos de descarbonização assumidos por Portugal e com a estratégia delineada para o setor electroprodutor no PNEC 2030, Portugal cessou a produção de eletricidade a partir de carvão em 2021, antecipando o prazo inicialmente previsto.

  2. Portugal, enquanto membro da Powering Past Coal Alliance, assumiu, ainda em 2016, o compromisso de deixar de produzir eletricidade a partir de carvão o mais tardar até 2030, transição considerada oportuna e necessária para cumprir os compromissos internacionais estabelecidos pelo Acordo de Paris. Mais tarde e atenta a existência de fatores que desincentivam a produção de eletricidade a partir de carvão, como a subida do preço das licenças de emissão de CO2, o fim da isenção do imposto sobre os produtos petrolíferos (ISP) e o aumento do preço do carvão, bem como estudos de segurança de abastecimento efetuados, estipulou-se um objetivo de encerrar as centrais térmicas do Pego em 2021 e de Sines em 2023. Portugal conseguiu antecipar este compromisso, tendo encerrado definitivamente as duas centrais em 2021.

  3. O mais recente inventário nacional de emissões de Gases com Efeito de Estufa mostra que em 2022 ocorreu uma redução de 56% nas emissões do setor de produção de eletricidade e de calor face ao ano anterior. Esta redução deveu-se à cessação da utilização de carvão neste setor, associada ao incremento na produção de eletricidade a partir de fontes renováveis. Adicionalmente, também se verifica uma redução do valor de fator de emissão da eletricidade por MWh produzido, sobretudo ao nível do continente, observando-se, desde 2018, uma redução de 70% neste valor.

  4. Acresce que, com o objetivo de assegurar uma transição justa, foram adotadas medidas de apoio aos trabalhadores e à diversificação económica das regiões afetadas, incluindo a sua inclusão nas áreas territoriais que podem aceder ao Fundo para uma Transição Justa, e foi, ainda, desenvolvido, em 2021, um estudo para aferir as necessidades de requalificação profissional dos trabalhadores das Centrais, e criado um “Mecanismo de Compensação para a transição justa”.

 

Sumário da Avaliação Portugal 2024

 

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