DESCRITORES
ALTERAÇÃO DO RESULTADO FINANCEIRO POR ILEGALIDADE / CERTIFICAÇÃO AMBIENTAL / CONCURSO LIMITADO POR PRÉVIA QUALIFICAÇÃO / CONCURSO PÚBLICO / DOCUMENTO PROBATÓRIO / PRINCÍPIO DA TAXATIVIDADE / PROCEDIMENTO CONCURSAL / QUALIFICAÇÃO PRÉVIA / RECUSA DE VISTO / RESTRIÇÃO DE CONCORRÊNCIA.
SUMÁRIO
- A entidade adjudicante pode proceder à escolha do procedimento concursivo dentro dos critérios e limites estabelecidos pela lei e respeitando o princípio da taxatividade dos procedimentos – apenas aqueles tipificados pelo legislador podem ser empregues, não podendo a entidade adjudicante utilizar qualquer modelo.
- Esta rigidez não impede, porém, que a entidade adjudicante possa introduzir algumas especificidades na tramitação: assim, quer no concurso público (Art.º 132.º, n.º 4, do Código dos Contratos Públicos [CCP]), quer no concurso limitado por prévia qualificação (Art.º 189.º, n.º 4, do mesmo CCP), o legislador permite que a entidade adjudicante estabeleça regras específicas, “desde que não tenham por efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência”.
- Este limite da ausência de efeito impeditivo, restritivo ou falseador da concorrência não depende da existência de intencionalidade, ou seja, qualquer cláusula que venha a revelar-se ter esse efeito será ilegal, independentemente de se demonstrar que o mesmo foi previsto ou querido pela entidade adjudicante.
- Ao impor a apresentação de documento comprovativo de uma certificação ambiental como condição de acesso ao concurso nestes dois contratos, a entidade requerente introduziu no procedimento de concurso público (no respetivo Programa de Procedimento) um requisito de qualificação prévia que o legislador não admite neste tipo procedimental.
- Pois a certificação ISO não é um requisito imposto pelo legislador para que as empresas atuem em determinado setor ou um critério obrigatório para que certa atividade possa ser exercida – no âmbito de previsão do Art.º 81.º, n.º 8, do CCP –, já que tal certificação visa, apenas e essencialmente, garantir padrões de qualidade das empresas.
- E ao fazê-lo, a entidade requerente restringiu a concorrência, pois introduziu uma limitação ilegal ao leque de potenciais concorrentes, o que torna a cláusula ilegal, nos termos do Art.º 132.º, n.º 4, in fine, a contrario, do CCP – sendo aqui irrelevantes as justificações invocadas pela entidade requerente no seu contraditório pois para a conformação da ilegalidade basta o efeito restritivo, independentemente da intencionalidade.
- Ainda que assim se não entendesse e se pudesse considerar ser legal a exigência da certificação ambiental por parte da entidade requerente, sempre o procedimento seria inválido por falta de cumprimento da obrigação imposta pelo Art.º 72.º, n.º 3, do CCP.
- Nesse sentido, a falta de junção de tal certificação – tratando-se da certificação de um requisito de constituição prévia ao início do procedimento – seria o incumprimento de uma obrigação acessória exigida pelo Programa de Procedimento, cujo suprimento nada afetaria a igualdade de tratamento entre os concorrentes, pois todos os atributos e elementos essenciais das propostas eram já conhecidos, nomeadamente o preço proposto, que em nada poderia ser alterado pela junção posterior da certificação.
- Nessa perspetiva, não tendo o júri cumprido o dever que sobre si era imposto pelo citado Art.º 72.º, n.º 3, violou não apenas tal norma, mas também os Art.ºs 57.º e 146.º, n.º 2, todos do CCP, ilegalidades de que se concluir estarem também afetados os contratos.
- Assim, a violação de lei constatada, por incorreta exclusão da concorrente que ofereceu o preço mais baixo e a adjudicação à concorrente que deveria ter sido graduada em segundo lugar, consubstancia uma prática suscetível de alterar o resultado financeiro dos contratos, o que, nos termos da alínea c) do n.º 3 do Art.º 44.º da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, constitui, de per si, motivo de recusa de visto do respetivo contrato.
- Além disso, a inclusão no Programa de Procedimento da cláusula que exigia ilegalmente a comprovação da certificação ambiental é suscetível de provocar o afastamento de potenciais concorrentes que poderiam eventualmente oferecer preços ainda mais baixos, pelo que se verifica também uma alteração potencial do resultado financeiro do contrato.
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