REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS
CONTROLO SUCESSIVO
 

RELATÓRIO DE OUTRAS AÇÕES DE CONTROLO N.º 1/2022-1ªS E 4/2022-2ªS
ACOMPANHAMENTO DA CONTRATAÇÃO PÚBLICA ABRANGIDA PELAS MEDIDAS ESPECIAIS PREVISTAS NA LEI N.º 30/2021
2022-10-19
Processo n.º 1/2021 – OAC-PG

Relatores: Conselheiros Helena Abreu Lopes e Miguel Pestana Vasconcelos

DESCRITORES

ADJUDICATÁRIOS / AJUSTE DIRETO SIMPLIFICADO / CIMEC / CONCURSO PÚBLICO SIMPLIFICADO / CONSULTA PRÉVIA SIMPLIFICADA / CONTRATAÇÃO PÚBLICA / EFICÁCIA / FUNDAMENTAÇÃO / FUNDAMENTO E OBJETO DAS MECP / FUNDOS EUROPEUS / INCUMPRIMENTO / IMPEDIMENTOS E CONFLITOS DE INTERESSES / MECP / PAGAMENTO / PROCEDIMENTOS E PRESSUPOSTOS / PRR / RISCOS / TEMPESTIVIDADE / TRANSPARÊNCIA.
 

SUMÁRIO

Este relatório insere-se na Ação Intersectorial para “Acompanhamento da Contratação Pública abrangida pelas Medidas Especiais previstas na Lei n.º 30/2021”, com representantes das 1.ª Secção, 2.ª Secção e Secções Regionais do Tribunal e aprovada pelo Plenário Geral em 9 de julho de 2021.

Trata-se do 2.º Relatório (1.º Relatório de Acompanhamento (Relatório n.º 1/2021-OAC/PG) e incide sobre as Medidas Especiais de Contratação Pública (MECP) aprovadas pela Lei n.º 30/2021, que entrou em vigor em 20 de junho de 2021, e que se traduzem num regime excecional com o objetivo de simplificar e agilizar procedimentos pré-contratuais e, dessa forma, dinamizar o relançamento da economia.

Nos termos do n.º 2 do artigo 17.º da Lei n.º 30/2021, os contratos celebrados na sequência de quaisquer procedimentos adotados ao abrigo das MECP previstas na referida Lei que sejam de valor inferior ao fixado no artigo 48.º da Lei n.º 98/97, de 28 de agosto, devem ser eletronicamente remetidos ao Tribunal de Contas para efeitos de fiscalização concomitante, até 10 dias após a respetiva celebração, acompanhados do respetivo processo administrativo. Entre 20 de junho de 2021 e 30 de junho de 2022 foi enviada ao Tribunal de Contas informação que reporta a celebração de 406 contratos ao abrigo de MECP, envolvendo um montante global de € 49 941 694,91. Estes 406 contratos representam apenas cerca de 0,24% dos contratos públicos de valor inferior a € 750 000 registados no portal dos contratos públicos no mesmo período, o que continua a indiciar um grau de aplicação deste regime muito pouco significativo.

De acordo com o n.º 1 do mesmo artigo, os contratos celebrados na sequência de procedimentos de concurso público ou concurso limitado por prévia qualificação simplificados de valor igual ou superior ao fixado no artigo 48.º da Lei n.º 98/97 ficam sujeitos a fiscalização prévia do Tribunal de Contas, nos termos gerais. No mesmo período foram submetidos a fiscalização prévia do Tribunal de Contas 26 contratos relativos a MECP, no montante global de € 38 010 981,88.

É entendimento deste Tribunal que, desde que os contratos integrem alguma das medidas especiais de contratação pública previstas na Lei n.º 30/2021, a obrigação de remessa eletrónica dos mesmos ao Tribunal de Contas se estende a todos os que estejam, de algum modo, dispensados de fiscalização prévia, qualquer que seja o seu valor. A obrigação de remessa estende-se também a todos os contratos que operem modificações a contratos anteriormente comunicados.

O Tribunal de Contas procedeu à análise da informação relativa aos contratos MECP que lhe foram submetidos até 30 de junho de 2022 e à verificação de vários aspetos relativos aos mesmos, tendo em conta os riscos que já havia identificado no 1.º relatório de acompanhamento. Para o efeito, quando necessário, obteve informação complementar junto dos serviços ou desencadeou auditorias, que ainda se encontram em curso. As verificações efetuadas sustentam as seguintes observações:

  1. No Continente continua a recorrer-se, embora de forma pouco significativa, ao regime das medidas especiais de contratação pública, em especial no domínio das aquisições de serviços, sendo a utilização deste regime nas Regiões Autónomas praticamente nula;

  2. Não está ainda criada no Portal BASE a secção específica dedicada aos procedimentos e contratos abrangidos pelas MECP e a informação constante desse portal não permite apurar a dimensão precisa do recurso a esse regime;

  3. Indiciam-se alguns casos de incumprimento do dever de comunicação das MECP ao Tribunal de Contas;

  4. 31,03% dos contratos produziram efeitos antes de comunicados ao Tribunal de Contas, tendo em 7,64% ocorrido pagamentos;

  5. Há mecanismos de transparência e controlo nas MECP, mas são necessários ajustamentos no regime e funcionamento do portal BASE, na concretização de mais ações de fiscalização, na transparência e utilização do Registo Central de Beneficiário Efetivo (RCBE) e na estruturação harmonizada das várias bases de dados relevantes;

  6. 72,76% do montante contratado ao abrigo de MECP respeitou a projetos financiados ou cofinanciados por fundos europeus, incluindo no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), destinando-se 56,41% à aquisição de equipamentos informáticos, licenças de software ou serviços relacionados com Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC);

  7. A preponderância da utilização de procedimentos não concorrenciais tem vindo a diminuir: embora aplicados em 84,26% dos casos de MECP, abrange agora apenas 41,71% do montante contratado; aumentou a utilização de procedimentos concorrenciais no domínio dos contratos com financiamento europeu; 88,9% do montante dos contratos MECP financiados pelo PRR submetidos ao TdC foi adjudicado por procedimentos concursais;

  8. Em regra, foram cumpridos os procedimentos legalmente aplicáveis em função do valor de cada contrato e não se verificaram indícios de violação dos pressupostos das MECP aplicadas;

  9. Ainda assim, identificaram-se alguns casos em que o montante conjunto de contratos envolvendo prestações do mesmo tipo exigiria a adoção de um outro procedimento pré-contratual;

  10. No domínio dos contratos com financiamento europeu continuam a verificar-se insuficiências de documentação quanto ao financiamento envolvido e falta de fundamentação das decisões de redução dos prazos para apresentação de propostas;

  11. 90,83% do montante dos contratos MECP financiados pelo PRR submetidos ao TdC destinou-se à aquisição de tecnologias de informação e comunicação; os contratos foram maioritariamente adjudicados por entidades da Administração Central e do Setor Empresarial do Estado a empresas de média, pequena ou micro dimensão;

  12. Continuam a verificar-se insuficiências de documentação e fundamentação das decisões, em particular quanto à explicitação das necessidades a satisfazer, à redução do prazo para apresentação de propostas e candidaturas, à escolha das entidades a convidar em consultas prévias e ajustes diretos e à justificação e justeza do preço aceite;

  13. Em 26,85% dos casos não foram exigidas aos intervenientes nos procedimentos de contratação pública declarações sobre a inexistência de conflitos de interesses e em 28,82% não foi junta a declaração a que se refere o Anexo II do CCP;

  14. Continuam a ocorrer muitas situações em que as empresas convidadas a participar em procedimentos não apresentam proposta;

  15. 66,50% dos contratos foram adjudicados a micro, pequenas ou médias empresas;

  16. Identificaram-se alguns casos em que os limites de adjudicações sucessivas aos mesmos adjudicatários já foram atingidos;

  17. A lei não é clara no estabelecimento de limites para os ajustes diretos simplificados aos mesmos adjudicatários;

  18. Identificaram-se alguns casos em que o mesmo adjudicante celebrou contratos por ajuste direto simplificado a entidades relacionadas entre si, excedendo os limiares para a realização desse procedimento;

  19. Embora perto de 50% do montante contratado não esteja garantido por caução, do qual ¼ respeita a contratos de prazo superior a um ano, a situação evoluiu positivamente relativamente a 2021, quando as garantias prestadas cobriam apenas 20,1%.

O Tribunal formulou recomendações aos órgãos legislativos, designadamente quanto à reponderação da justificação e utilidade do regime das MECP, à eliminação das dispensas de fundamentação aí previstas e à clarificação do regime de proibição de adjudicações sucessivas não concorrenciais aos mesmos adjudicatários, bem como às entidades adjudicantes, quanto ao rigoroso cumprimento das normas definidas.

 

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