REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS
RESPONSABILIDADES FINANCEIRAS
 

SENTENÇA Nº 6/2021 – 3ª S
2021-02-24
Processo nº 5/2020-JRF

Relator: Conselheiro António Francisco Martins

DESCRITORES

ATENUAÇÃO ESPECIAL DA MULTA / AUDITOR INTERNO / CULPA / DISPENSA DE MULTA / INFRAÇÃO CONTINUADA / INFRAÇÃO FINANCEIRA SANCIONATÓRIA / INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO / PRESCRIÇÃO / RELEVAÇÃO DE RESPONSABILIDADE FINANCEIRA
 

SUMÁRIO

  1. O facto gerador da interrupção da prescrição é a audição do responsável e não a audição institucional da entidade auditada, porquanto é com a “audição do responsável” pela infração financeira, que este pode exercer o seu contraditório pessoal.
  2. A culpa, na modalidade de negligência, implica uma censura à conduta do agente por, em função da qualidade e responsabilidade de que estava investido, ter o dever de observar e fazer cumprir, nos procedimentos aquisitivos de bens e serviços, as regras da contratação pública e da legalidade da autorização de despesas e assunção de compromissos, não tendo tomado o devido cuidado quanto à observância e cumprimento das mesmas e, assim, não tendo atuado com a prudência e diligência que era devida e de que era capaz.
  3. Cabendo ao órgão colegial, Conselho de Administração, “o exercício de todos os poderes de gestão que não estejam reservados a outros órgãos”, o exercício de funções por parte dos membros do CA, ainda que sem as competências consideradas necessárias ou sem o fornecimento dos meios considerados adequados por parte da tutela, não isenta os demandados de culpa.
  4. A realização de procedimento similar a um outro anterior, com o mesmo objeto e com o mesmo cocontratante, em que foi cometida, no essencial, a mesma omissão e inerente violação das regras da contratação pública e/ou violação do regime financeiro de autorização de despesas e assunção de compromissos, permite concluir que estamos no quadro da mesma situação exterior em que a culpa do agente pode considerar-se diminuída e, nessa medida, verificados os pressupostos do instituto da continuação delituosa.
  5. O recrutamento de auditor interno, para funções nos Hospitais EPE, não tendo sido invocado tratar-se de um caso de “manifesta urgência”, deve acautelar os princípios da publicidade, imparcialidade e igualdade de oportunidades, em observância do direito de acesso a cargos públicos, garantido constitucionalmente (artigo 50.º da CRP), da subordinação dos órgãos e agentes administrativos ao princípio da imparcialidade (artigo 266.º da CRP) e do regime previsto no artigo 14.º do DL 233/20005 de 29.12.
  6. O não cumprimento do dever de publicitação do contrato previsto no artigo 127.º do CCP, por si só, ou seja, sem mais, não pode qualificar-se como uma “violação de normas legais ou regulamentares relativas à contratação publica”, não integrando tal conduta a previsão típica, objetiva, da infração da alínea l) do nº 1 do art.º 65º da LOPTC.
  7. A relevação da responsabilidade financeira é da competência da 1ª e 2ª Secções do Tribunal de Contas, na fase anterior à fase jurisdicional, não sendo possível tal relevação no âmbito do julgamento de responsabilidades financeiras, da competência da 3ª Secção deste Tribunal.
  8. A dispensa de aplicação de multa não é automática, não é uma obrigação ope legis do Tribunal, mas antes um poder/dever, a operar em função de todas as circunstâncias do caso concreto.
  9. Ocorrendo, em concreto, circunstâncias anteriores e/ou posteriores diminuidoras, de forma acentuada, da ilicitude e/ou da culpa dos demandados, estão verificados os pressupostos da possibilidade de atenuação especial da multa.

 

TRANSFERIR TEXTO INTEGRAL