REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS
RESPONSABILIDADES FINANCEIRAS
 

SENTENÇA Nº 5/2021 – 3ª S
2021-01-22
Processo nº 2/2019-JRF

Relator: Conselheira Helena Ferreira Lopes

DESCRITORES

ARTIGO 9.º N.ºS 6 E 7 DA LEI 12-A/2011 VERSUS ARTIGO 59.º, N.º 4, DA LOPTC / CONSEQUÊNCIAS / NATUREZA DA RESPONSABILIDADE REINTEGRATÓRIA / PAGAMENTOS INDEVIDOS / RELEVAÇÃO DA RESPONSABILIDADE
 

SUMÁRIO

  1. A violação do disposto no último segmento da alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º da Lei 10-A/2010, de 20.06, por parte dos Demandados e autarcas, é suscetível de os fazer incorrer em responsabilidade financeira reintegratória consubstanciada na obrigação de repor no erário municipal as importâncias abrangidas pela infração, a que Lei denomina de pagamentos indevidos, por a tal impor o disposto nos n.ºs 6 e 7.º da Lei 12-A/2010, aplicáveis “ex vi” do disposto no n.º 5 do artigo 10.º da mesma Lei.
  2. Com a revogação do artigo 9.º desapareceu da ordem jurídica o «conceito» de pagamentos indevidos ínsito no n.º 7 daquele artigo, o que quer dizer que, a partir de 1Jan2014, os pagamentos ilegais efetuados pelo D2 ao contratado só poderão qualificar-se como pagamentos indevidos se se verificarem os requisitos do n.º 4 do artigo 59.º da LOPTC.
  3. Considerarem-se pagamentos indevidos, para o efeito de reposição, os pagamentos ilegais que causarem dano para o erário público (i) quer porque não haja contraprestação efetiva (ii) quer porque, havendo-a, esta não seja adequada ou proporcional à prossecução das atribuições da entidade em causa ou aos usos normais de determinada atividade.
  4. Tendo a ilegalidade ocorrido na vigência do n.º 7 do artigo 9.º da Lei 12-A/2010 (aplicável por força do n.º 5 do artigo 10.º da mesma Lei), o “conceito” de pagamentos indevidos aplicável, à exceção dos pagamentos ocorridos posteriormente a 31Jan2014, é o ínsito naquela norma, tanto mais que estamos perante uma norma excecional, que, de acordo com a própria lei, prevalece sobre todas as disposições legais, gerais ou especiais, contrárias (v. nºs 8 e 9 dos artigos 9.º e 10.º daquela lei, respetivamente), a que acresce o facto da responsabilidade reintegratória ter natureza ressarcitória/indemnizatória, e, portanto, civilista, pelo que lhe aplicável a lei em vigor à data dos factos, atento o disposto no artigo 12.º do Código Civil, o que exclui a aplicação do princípio da aplicação retroativa da lei mais favorável e, consequentemente, a aplicação do artigo 61.º, n.º 2, na redação atual, introduzida pelo artigo 248.º da LOE/2016, e ainda a alegada violação do princípio de nullum crimen, nulla poena sine lege stricta, previsto no artigo 29.º da CRP. É que tendo esta ilegalidade ocorrido na vigência do n.º 7 do artigo 9.º da Lei 12-A/2010 (aplicável por força do n.º 5 do artigo 10.º da mesma Lei), é este o “conceito” de pagamentos indevidos aplicável ao caso dos autos, tanto mais que estamos perante uma norma excecional, que, de acordo com a própria lei, prevalece sobre todas as disposições legais, gerais ou especiais, contrárias (v. nºs 8 e 9 dos artigos 9.º e 10.º daquela lei, respetivamente), a que acresce o facto da responsabilidade reintegratória ter natureza ressarcitória/indemnizatória, e, portanto, civilista, pelo que lhe aplicável a lei em vigor à data dos factos, nos termos do artigo 12.º do Código Civil, o que também exclui a aplicação do princípio da aplicação retroativa da lei mais favorável e, consequentemente, a aplicação do artigo 61.º, n.º 2, na redação atual, introduzida pelo artigo 248.º da LOE/2016.
  5. Atenta factualidade dada como provada, designadamente (i) o facto de a infração financeira reintegratória ter sido cometida com negligência ((ii) de o erário municipal não ter ficado depauperado com os pagamentos dos vencimentos, no montante de 34.775,39€, efetuados ao contratado, uma vez que este exerceu efetivamente as funções para as quais foi contratado; (iii) de o falecido Presidente não ter tido qualquer benefício pessoal material com os referidos pagamentos, e de, por consequência, não ter havido qualquer enriquecimento ilícito da herança do herdeiro habilitado do falecido Presidente, o D1; (iv) de a contratação e consequentes pagamentos se inserirem dentro das atribuições do Município; (v) o lapso de tempo, entretanto, decorrido (quase 10 anos desde a data da abertura do concurso, e mais de 7 anos desde a data em último pagamento), justifica-se a relevação da responsabilidade financeira reintegratória, nos termos do nº 1 e 2 do artigo 64.º da LOPTC.

 

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