REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS
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ACÓRDÃO N.º 38/2024 – 3ª S/PL
2024-10-18
Recurso Ordinário n.º 6/2024
Processo n.º 2/2024-JRF

Relator: Conselheiro José Mouraz Lopes

DESCRITORES

AUDITORIA / CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE / CULPA DIMINUTA / DESPESAS DE JUNTA DE FREGUESIA / INFRAÇÃO CONTINUADA / PAGAMENTOS INDEVIDOS / PLURALIDADE DE INFRAÇÕES / PROCESSO DE RESPONSABILIDADE FINANCEIRA.
 

SUMÁRIO

  1. O julgamento por responsabilidades financeiras, através do processo jurisdicional, tem sempre subjacente a evidenciação de factos apurados em «fases» anteriores, sustentadas em ações de controlo concretizadas ou pelo Tribunal de Contas ou por órgãos de controlo interno finalizadas em relatórios que, por isso comportam uma condição de procedibilidade do processo de responsabilidade financeira.

  2. Tais relatórios decorrem de auditorias stricto sensu ou de outras ações de controlo como as Verificações Externas de Contas e Verificações Internas de Contas, ou os relatórios a que se refere o artigo 84º da LOPTC.

  3. É absolutamente válido, como condição de procedibilidade, um relatório levado a termo pela 2ª secção do TdC, sustentado num conjunto de factos indiciados e evidenciados em documentação recolhida de várias fontes, obedecendo aos princípios e normas estabelecidas quer na LOPTC quer no seu Regulamento, orientado por princípios, métodos e técnicas de auditoria, nomeadamente os princípios da legalidade e do contraditório, sem que se identifiquem quaisquer violações de direitos fundamentais.

  4. Consideram-se pagamentos indevidos, para o efeito de reposição, os pagamentos ilegais que causarem dano para o erário público, incluindo aqueles a que corresponda contraprestação efetiva que não seja adequada ou proporcional à prossecução das atribuições da entidade em causa ou aos usos normais de determinada atividade.

  5. Os Presidentes de Junta de Freguesia, enquanto eleitos locais, têm direito a uma remuneração ou compensação mensal e a despesas de representação, quando exerçam o cargo em regime de permanência.

  6. Quando isso não ocorre, o pagamento de tais despesas é ilegal e, sendo efetuado, porque causou um dano ao erário público correspondente ao valor pago, conforma uma situação de pagamentos indevidos.

  7. Toda a atuação do autarca, no caso o Presidente da Junta de Freguesia, é efetuada na prossecução do interesse público, não sendo o interesse público critério para ultrapassar a exigência de legalidade, máxime no domínio financeiro.

  8. A ratio do interesse público subjacente à atuação das autarquias está no assegurar das necessidades coletivas, nomeadamente dos interesses próprios das populações da área da autarquia e, no caso, concretamente, de uma Junta de Freguesia.

  9. Os interesses coletivos, próprios das populações, sendo muito variados e podendo assumir relevo diferenciado consoante a tipologia social, cultural das freguesias, conformam sempre o interesse geral. E nunca os interesses particulares de uma ou outra pessoa ou um ou outro grupo restrito de pessoas.

  10. Podendo existir satisfação de necessidades pessoais do presidente da Junta de Freguesia, a aquisição pela referida autarquia a uma Agência Funerária de coroas de flores e anúncios publicados na necrologia de jornal relativos a familiares de membros dos órgãos da autarquia, não constituem necessidades coletivas das populações. Não assumindo as mesmas despesas interesse público não têm qualquer justificação legal.

  11. O regime jurídico da «continuação criminosa», quando estão em causa pluralidade de infrações, apenas se aplica às infrações financeiras sancionatórias.

  12. Não configura uma situação de culpa diminuta a prática de por várias infrações durante um período alargado de tempo.

 

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