REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS
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SENTENÇA N.º 21/2024 – 3ª S
2024-06-20
Processo n.º 1/2024-JRF

Relator: Conselheiro António Francisco Martins

DESCRITORES

COMPETÊNCIA / COVID19 / DIVIDA PÚBLICA FUNDADA / EMPRESA MUNICIPAL / ESTAÇÕES COMPETENTES / EXECUÇÃO DE ATO / FISCALIZAÇÃO PRÉVIA / INFRAÇÃO FINANCEIRA SANCIONATÓRIA / INTERNALIZAÇÃO / ISENÇÃO DE FISCALIZAÇÃO PRÉVIA / PAGAMENTOS / PRESCRIÇÃO / PRINCÍPIO DA UNIDADE DA DESPESA / RELEVAÇÃO DA RESPONSABILIDADE FINANCEIRA / SERVIÇOS COMPETENTES / SUSPENSÃO DO PRAZO / VEC.
 

SUMÁRIO

  1. A conduta dos demandados, presidente e vice-presidente do executivo municipal, de autorizarem ordens de pagamentos de “rendas” de um “denominado contrato de arrendamento”, sem submeterem previamente a despesa em causa à autorização do executivo municipal e da assembleia municipal, competentes para autorizar tal despesa atento o seu montante anual e a plurianualidade anual da despesa, preenche o elemento objetivo da infração financeira sancionatória prevista no artigo 65.º, n.º 1, alínea b), 2.ª parte, da LOPTC, por violação de norma financeira sobre a autorização e pagamento de despesas públicas.

  2. Tendo aquele denominado “contrato de arrendamento” sido celebrado cerca de um ano e meio depois da deliberação de dissolução da empresa municipal, mediante a transmissão global de todo o seu património (ativo e passivo) para o município, a obrigação resultante do mesmo (pagamento de rendas por 21 anos, no montante global de 21.114.434,10 € + IVA), não está abrangida pelo perímetro da internalização, por não ser um passivo considerado naquela deliberação.

  3. Nessa medida, o pagamento das rendas não pode ser considerado mera execução da deliberação de internalização.

  4. Os atos relativos à realização de despesa pública devem ter em conta o princípio da unidade da despesa, nos termos do qual “a despesa a considerar é a do custo total da locação ou da aquisição de bens ou serviços”.

  5. A conduta omissiva do demandado, presidente do executivo municipal, de não submissão a fiscalização prévia, da deliberação da assembleia municipal de dissolução, liquidação e internalização de uma empresa, aí considerada como empresa municipal, incluindo o seu passivo, no qual se integrava um mútuo de médio/longo prazo, e tendo procedido à execução daquela deliberação, celebrando a escritura de transmissão de Ações, Dissolução, Liquidação e Partilha de Património Societário da empresa, configura o preenchimento do elemento objetivo da infração financeira sancionatória prevista no artigo 65.º, n.º 1, alínea h), 1.ª parte, por não submissão a fiscalização prévia de ato legalmente sujeito a tal fiscalização, por ser gerador de aumento da divida pública fundada do município, e execução do ato não submetido a fiscalização.

  6. O artigo 65.º-A do RJAEL, apenas veio consagrar que o limite da dívida total estabelecida no artigo 52.º do RFALEI, não inviabiliza ou prejudica a assunção da dívida da empresa local e que a ultrapassagem dos fundos disponíveis não gera a responsabilidade prevista no artigo 11.º da LCPA, mas não prevê nenhuma situação de isenção de fiscalização prévia.

  7. Por “estações competentes” ou “serviços competentes” devem entender-se aqueles que, no âmbito da orgânica da entidade pública em causa ou no âmbito dos serviços públicos, têm atribuídas competências legais para informar os decisores e gestores públicos sobre a matéria em causa.

  8. Não integram o conceito de “estações competentes” ou “serviços competentes” quaisquer outras realidades, nomeadamente situadas na atividade privada, de que os decisores e gestores públicos se socorram, consultando ou pedindo pareceres, nomeadamente jurídicos.

  9. Apesar da sua denominação de “verificação interna de contas”, sendo a ação de controlo levada a cabo pelo Tribunal, substancial e materialmente, uma verificação externa de contas, a qual foi realizada com recurso aos “métodos e técnicas de auditoria”, com elaboração de “relato” e observância do princípio do contraditório e posterior aprovação de “relatório”, do qual constou, designadamente, “a concretização das situações de facto e de direito integradoras de eventuais infrações financeiras e seus responsáveis”, o prazo de prescrição suspende-se com o “início da auditoria” e não com “a entrada da conta no Tribunal”.

  10. Os períodos de suspensão do prazo de prescrição constantes do regime excecional e temporário de suspensão do prazo de prescrição, por força da legislação excecional introduzida no âmbito da pandemia da Covid19, são de considerar um acrescento aos períodos legalmente estabelecidos de suspensão de prazos, nas várias legislações que os preveem e, no caso das infrações financeiras, aos prazos a que alude o artigo 70.º da LOPTC.

  11. É da exclusiva competência da 1ª e 2ª Secções deste Tribunal operar a relevação da responsabilidade financeira, na fase de auditoria, ou seja, em fase anterior à fase jurisdicional de julgamento de responsabilidades financeiras, esta no âmbito da competência da 3.ª Secção.

 

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