DESCRITORES
CESSÃO DA POSIÇÃO CONTRATUAL / CESSÃO DA POSIÇÃO CONTRATUAL POR INCUMPRIMENTO DO COCONTRATANTE / CONTRATO-INSTRUMENTO / INCUMPRIMENTO DO CONTRATO / NOVO CONTRATO / RESOLUÇÃO POR INCUMPRIMENTO / RESOLUÇÃO SANCIONATÓRIA / TRANSMISSÃO DAS OBRIGAÇÕES.
SUMÁRIO
- A cessão da posição contratual é um instituto típico do Direito Civil, sendo o contrato através do qual o outorgante de um outro contrato transmite a um terceiro, com o consentimento do outro outorgante, o complexo de direitos e obrigações que para si derivam de tal contrato.
- Tal figura envolve três sujeitos (o cedente, o cedido e o cessionário) e pressupõe a existência de dois contratos: o contrato-base (aquele inicialmente celebrado, onde se consagrou o conjunto de direitos e deveres que serão objeto da cessão) e o contrato-instrumento (aquele através do qual se opera a transmissão da posição contratual).
- No âmbito do Direito da Contratação Pública, as especiais exigências impostas pelos princípios da transparência, da concorrência e da igualdade levaram à adaptação daquele instituto do Direito Civil: apesar de no art.º 316.º do Código dos Contratos Públicos (CCP) se prever uma norma geral de admissibilidade de cessão da posição contratual, nos artigos seguintes o legislador estabeleceu um conjunto de requisitos que visam impedir que através da sua utilização sejam violados aqueles princípios estruturantes.
- Assim, se quanto à cessão promovida pelo contraente público se consagra uma quase total liberdade – podendo o cocontratante apenas recusá-la quando tenha fundado receio de que a mesma envolve um aumento de risco de incumprimento das obrigações emergentes do contrato pelo potencial cessionário ou a diminuição das suas garantias (art.º 324.º, do CCP) – já no que toca à cessão da posição contratual do cocontratante os limites legais são muito mais apertados, pois de outro modo ficaria aberta uma via para contornar as exigências procedimentais que precedem a celebração dos contratos públicos.
- Na reforma do CCP introduzida pelo Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31-08, o legislador consagrou no art.º 318.º-A uma nova figura que assume características distintas – a cessão da posição contratual por incumprimento do cocontratante.
- Quando a relação contratual esteja em situação que permitisse ao contraente público proceder à sua resolução por incumprimento das obrigações que impendem sobre o cocontratante e caso tenha essa possibilidade sido prevista no próprio contrato, pode o contraente público impor ao cocontratante a cessão, o que faz mediante ato administrativo, sendo tal cessão eficaz a partir da data por si indicada, nos termos do n.º 4 do art.º 318.º-A, do CCP.
- A escolha do cessionário também não é livre, estando o contraente público obrigado a interpelar, gradual e sequencialmente, os concorrentes que participaram no procedimento pré-contratual original, de acordo com a respetiva classificação final, a fim de concluir um novo contrato para a adjudicação da conclusão dos trabalhos – art.º 318.º-A, n.º 2.
- Esta figura tem traços muito distintos da cessão da posição contratual civil e também da geral da contratação pública: quer quanto ao momento em que pode operar (não quando os contraentes livremente decidam, mas só quando estejam reunidos os pressupostos para a resolução do contrato por incumprimento), quer quanto à liberdade contratual das partes (o cedente não pode optar por celebrar ou não a cessão e escolher o cessionário com quem o irá celebrar, limitando-se o cedido a autorizar ou não autorizar a cessão; pelo contrário, o cedido – contraente público – impõe a cessão ao cedente – cocontratante – não sendo este livre de optar pela celebração ou não da cessão, não podendo escolher a quem cederá a posição contratual, nem podendo escolher o como e o quando de tal cessão, que opera por mero efeito do ato administrativo emitido pelo cedido, sendo este quem fixa a data a partir da qual produz efeitos).
- Não obstante tais diferenças, não deixamos de estar perante uma forma de transmissão das obrigações e não perante um novo contrato – trata-se de uma alternativa à resolução contratual e não de uma consequência desta.
- Quando o n.º 2 do art.º 318.º-A se refere a “concluir um novo contrato”, reporta se à necessidade de “adjudicação da conclusão dos trabalhos” (ou seja, à execução da parte ainda não executada pelo primitivo cocontratante), sendo este “novo contrato” o contrato-instrumento (aquele através do qual se opera a transmissão da posição contratual), típico da cessão da posição contratual.
- Trata-se, pois, do mesmo contrato, apenas se operando uma alteração dos seus sujeitos, sem que o contrato deixe de produzir efeitos – ao contrário da resolução, cuja consequência é a destruição dos efeitos do contrato e a sua consequente cessação.
- Também não se confunde esta figura com a resolução sancionatória: nesta há uma nova adjudicação da proposta ordenada em lugar subsequente, ao passo que no caso do art.º 318.º-A isso não acontece, continuando a ser a primeira proposta adjudicada aquela a ser executada pelo novo cocontratante.
- Para que possa o contraente público lançar mão do disposto no art.º 318.º-A do CCP, não pode o contrato celebrado já estar extinto por resolução.
- Sendo a declaração de resolução uma declaração unilateral recetícia, com o seu recebimento por parte da inicial cocontratante opera-se a resolução do contrato a partir da data indicada pela entidade adjudicante, cessando nesta todos os efeitos do contrato.
- Após a data da resolução já não pode a entidade adjudicante impor ao cocontratante inicial a cessão da posição contratual, pois nesse momento já o contrato cessou a sua produção de efeitos, não podendo a posição de qualquer das partes ser cedida a um terceiro.
- Perante uma situação de incumprimento das obrigações do cocontratante, à entidade adjudicante cabe optar por um de dois caminhos: ou a resolução do contrato ou a cessão da posição contratual. O que não pode é optar por ambas, fazendo operar a resolução e, posteriormente, pretendendo impor a cessão de posição contratual ao cocontratante.
- Nos termos do art.º 318.º-A, n.º 3 do CCP, a execução do contrato ocorre nas mesmas condições já propostas pelo cedente no procedimento pré-contratual original, havendo apenas da parte do novo cocontratante uma manifestação de vontade de se vincular aos termos da proposta apresentada pelo cocontratante inicial.
- Não pode o novo contrato ser a formalização dos termos da proposta que o novo cocontratante havia apresentado aquando do procedimento concursal, sob pena de não consubstanciar uma cessão da posição contratual, mas sim uma nova adjudicação.
- A falta de concurso dirigido à escolha do cocontratante implica a preterição total do procedimento legalmente exigido, que é causa de nulidade, nos termos do disposto no art.º 161.º, n.º 1, alínea l), do Código do Procedimento Administrativo, para que remete o n.º 2, do artigo 284.º do CCP..
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