ATUALIDADE NACIONAL 35 ANOS DA SECÇÃO REGIONAL DOS AÇORES: A HISTÓRIA DO SEU PERCURSO E O FUTURO DA SUA MISSÃO |
A Secção Regional dos Açores do Tribunal de Contas iniciou atividade em 1986, há 35 anos, um aniversário que o Tribunal assinalou em Ponta Delgada, onde está situada no Palácio Canto, numa cerimónia marcada pela História e pela memória fotográfica, mas também por uma visão para o futuro. A cerimónia dos 35 Anos da Secção Regional dos Açores decorreu no Teatro Micaelense – Centro Cultural e de Congressos, onde o Presidente do Tribunal de Contas, José Tavares, sublinhou o exercício da nobre missão constitucional da Secção Regional, e do Tribunal, de zelar pela boa aplicação dos dinheiros e valores públicos por parte de todas as entidades sediadas na Região Autónoma dos Açores, percorrendo também a História do Palácio Canto.
INTERVENÇÃO DO SENHOR CONSELHEIRO ARAÚJO BARROS NA SESSÃO COMEMORATIVA DOS 35 ANOS DA SECÇÃO REGIONAL DOS AÇORES Exm.º Senhor Embaixador Pedro Catarino, Representante da República para a Região Autónoma dos Açores Comemoramos os 35 anos de exercício da Secção Regional dos Açores do Tribunal de Contas. Esta instituição, como todos os entes gerados na emanação de certa ordem social, mais não é do que o precipitado dialético das realizações e representações de cada um daqueles que, individualmente ou em conjunção de vontades, contribuíram para a sua génese, amadurecimento e consolidação. Terá de ser, pois, em necessária visão diacrónica que se deverão perscrutar os pontos fortes que mais caracterizam o seu pulsar. O que nos relança para uma reflexão sobre a própria noção de região. Repudiando, desde logo, os que historicamente pretenderam enquadrar a autonomia regional numa lógica de mero desdobramento do poder, intentando colá-la a uma prosaica operação de descentralização. Um verdadeiro Estado Regional vai muito para além disso. Rezam os compêndios que o exercício do poder nunca conseguirá fugir a estruturar-se seguindo um esquema de pirâmide. E, afastadas as teorias teo-autocráticas que, postas em causa pela ideia rousseauniana do contrato social, foram ultrapassadas por modelos de cariz democrático-liberal, esse exercício será tanto mais legitimado quanto mais as decisões colherem os influxos que provêm da base da aludida pirâmide. É nessa linha que entronca o postulado de que, num estado regionalizado, pese embora os interesses e valores próprios de cada região sejam atuados por entidades autónomas, devem eles convergir também para a definição do todo nacional. Numa dinâmica afirmativa e de conjunção participativa. Bem nos antípodas dos conceitos de reconhecimento, de concessão e de dispersão que subjazem ao estado meramente descentralizado. Chamei à colação as precedentes considerações tão só para proporcionar uma melhor compreensão e realce da forma peculiar como a orgânica e funcionamento desta Secção Regional foram estruturados, desenvolvidos e consolidados. Maxime na sua articulação com o Tribunal de Contas, que lhe pré-existia. Tanto quanto é certo que, aquando da sua criação, há cerca de 40 anos, e instalação, data cujo 35º aniversário hoje se comemora, já a pretensão autonómica regional, aspiração de tradição centenária, tinha sido institucionalmente consagrada, com expresso e lato reconhecimento constitucional e estatutário, no ano de 1976. E, ao frisar esta nota, relembro que as Secções Regionais do Tribunal de Contas, único tribunal superior com assento nas regiões autónomas, fogem ao ilusório paradigma de que o exercício do poder jurisdicional não comporte regionalização. O que se revela claramente no plano institucional. Veja-se a participação dos seus juízes nos órgãos máximos do Tribunal de Contas, como o Plenário Geral e o Conselho Permanente. Ou a competência do Presidente do Tribunal de Contas para presidir e votar nas sessões do tribunal coletivo especial que aprova os relatórios e pareceres sobre as contas das regiões. Esta interpenetração tem-se aliás verificado a todos os níveis. Sendo incontáveis as ações, de âmbito nacional ou regional, em que os auditores e técnicos das secções regionais colaboram com os seus pares que exercem funções na sede. Vertente de interatividade que não belisca minimamente a exclusividade com que as secções regionais apreciam e dirimem os feitos que lhe estão por lei especificamente atribuídos. No caso da Secção Regional dos Açores do Tribunal de Contas, também na vertente vocacional se surpreendem marcantes particularidades. Que conferem uma feição peculiar à atuação aí desenvolvida, condicionando substancialmente a sua intervenção. Na verdade, até que ponto seria possível sustentar uma conceção ortodoxa e rigorosa dos princípios da concorrência e da igualdade de tratamento na contratação pública, perante a inevitabilidade de uma negociação relativa aos serviços essenciais que abarque a totalidade do arquipélago? A qual exclui liminarmente os potenciais concorrentes que não tenham uma certa dimensão. Mas que se impõe, sob pena de as populações das ilhas mais pequenas, onde a prestação desses serviços é menos rentável e apelativa, correrem o risco de não ser contempladas. E como lidar com as normas que estabelecem limites remuneratórios na função pública, face à necessidade de concentração de tarefas nos únicos profissionais existentes em determinadas ilhas? Ou, num plano mais lato, como ajuizar o défice crónico que afeta o exercício de muitas das entidades controladas? Cujas causas profundas terão quiçá origem em opções estratégicas menos conseguidas, quantas vezes inelutavelmente condicionadas por orientações políticas de âmbito regional ou nacional. Juízo de valor que, como não poderia deixar de ser, extravasa o âmbito de intervenção deste tribunal. O qual apenas o deverá encarar como epifenómeno, dele extraindo consequências, nomeadamente a título de incumprimento do princípio da responsabilidade intergeracional. Lembro também as dificuldades sentidas com as atípicas autarcas de uma certa freguesia, eleitas por 7 dos 26 recenseados nela residentes. Cuja impreparação as impele a recorrentemente faltar ao cumprimento da obrigação de prestar contas e cuja boçal ingenuidade torna extremamente difícil qualquer tipo de diálogo. Estas e outras singularidades de idêntico jaez impõem alguma versatilidade. E redobrada dose de bom senso. Que vêm indelevelmente caracterizando a atuação desta Secção Regional dos Açores do Tribunal de Contas. Avessa a juízos categóricos e definitivos. Privilegiando a mais das vezes a vertente pedagógica da sua intervenção, quiçá correndo por vezes o risco de sacrificar as desejáveis coerência e eficácia das decisões. Do que venho de referir, julgo poder fundadamente concluir ser este tribunal um paradigmático testemunho de como, também na área da justiça, com fiabilidade se devam encarar e potenciar as virtualidades de um estado regional. E, em suma, de como o bem servir uma região acaba por ser também a melhor maneira de mais bem servir o país. Não poderia deixar de aludir a uma circunstância que muito para tal terá contribuído. Que é a de os auditores e técnicos da Secção Regional das áreas de gestão e economia serem na sua quase totalidade formados na Universidade dos Açores. O que naturalmente lhes proporcionou um conhecimento muito próximo da realidade açoriana e lhes inculcou predisposição para especial perceção e compreensão dos meandros que lhe são peculiares. Como é evidente, tal cunho deve-se também muito aos ilustres juízes conselheiros que, antes de mim, aqui exerceram o seu múnus. José Faustino de Sousa, que com determinação e enorme competência orientou os primeiros passos e definiu o rumo desta Secção Regional. Nuno Lobo Ferreira, que impulsionou substancial obra de consolidação. António Francisco Martins, atual Vice-Presidente do Tribunal de Contas. Nuno Gonçalves, ora Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça. A representação do Ministério Público foi do mesmo modo sempre assegurada por pessoas de indesmentível mérito. Desde logo, o Senhor Juiz Conselheiro Manuel Mota Botelho, insigne e conceituado magistrado açoriano. Joana Marques Vidal, quiçá a mais consensual e prestigiada de entre os Procuradores Gerais da República que vimos servir este país. A nossa querida e saudosa Juiz Conselheira Laura Tavares. Não esquecendo o Senhor Procurador Geral Adjunto José Ponte, que ora com inegável proficiência vem exercendo o cargo. Está claro que nada teria sido possível não fora a competência, o empenho e o zelo de todos os dirigentes, auditores, técnicos e funcionários que aqui exerceram e exercem. Uma especial menção para os saudosos Drs. Carlos Barbosa e Paula Pacheco Vieira, que tão precocemente nos deixaram. Não poderia silenciar duas derradeiras palavras de reconhecimento. Ao Sr. Dr. Fernando Flor de Lima, que, durante mais de 20 anos, com o seu especial timbre, muito ajudou a conferir a este tribunal uma indefetível marca de eficiência e respeitabilidade. Ao Sr. Dr. João José de Medeiros que, com profundo conhecimento da realidade açoriana, aliado a uma sólida cultura jurídica e a uma tão sóbria quanto apurada inteligência, se vem assumindo como seu insubstituível sustentáculo. E vou terminar. Não sem antes me penitenciar por eventual jactância que possa ter transparecido do orgulho com que aqui apresentei a Secção Regional dos Açores do Tribunal de Contas. Se assim for, entendam-no tão só como uma fraqueza. De quem se sente tocado pela subida honra de poder terminar a sua carreira de magistrado exercendo funções neste prestigiado tribunal. Agradeço a todos a vossa presença. Sejam bem-vindos. José Manuel de Araújo Barros
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