DESCRITORES
ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA / CONTROLO FINANCEIRO DO SETOR PÚBLICO EMPRESARIAL / FISCALIZAÇÃO CONCOMITANTE / INDEMNIZAÇÃO / MADEIRA. REGIÃO AUTÓNOMA
SUMÁRIO
A auditoria – orientada para a apreciação da legalidade e regularidade da assunção e autorização da despesa global de € 5.670.200,00 pela Sociedade de Desenvolvimento do Porto Santo, S.A. (S.D.P.S.), durante um processo contencioso indemnizatório – concluiu que:
- Em 11 de outubro de 2019, o Conselho de Governo Regional autorizou a empresa pública S.D.P.S. a adquirir, «com todas as benfeitorias, direitos e ações, e livre de quaisquer ónus ou encargos», uma parcela de 11.842 m2 de um prédio rústico, localizado na zona do Penedo do Sono, com a área total de 36,388 ha, propriedade da empresa Pico de Baixo e Penedo – Investimentos Imobiliários, Lda., inscrito no Registo Predial do Porto Santo sob o n.º 02920/170594, pelo montante global de € 5.670.200,00;
- A assunção das despesas de € 811.769,10 (com a aquisição do imóvel) e de € 4.858.430,90 (com a obrigação de pagar uma indemnização) foi formalizada através de transação judicial celebrada em 14 de outubro, homologada por sentença no âmbito de um processo de arbitragem voluntária, transação essa celebrada entre a P.B.E.P., autora no processo e proprietária do imóvel em causa, lesada pelas rés S.D.P.S. e Região Autónoma da Madeira (RAM).
- A implantação parcial de empreendimentos públicos sobre aquela propriedade privada remonta ao lançamento da Operação Integrada de Desenvolvimento do Porto Santo, classificada de interesse público regional e gerida pela S.D.P.S.
- O prédio propriedade da P.B.E.P. foi reconhecido pelo Conselho do Governo Regional (em 2018) como indevidamente ocupado pela RAM.
- A área total adquirida (11.842 m2) na referida transação homologada por sentença concorreu para a fixação do valor a pagar à autora no processo arbitral; assim:
– O preço por m2 (€ 68,55) do terreno foi estabelecido com base num Parecer Técnico da Direção Regional do Património e Informática, totalizando um valor para a área adquirida de € 811.769,10;
– Uma indemnização ao proprietário, no montante restante do total autorizado e acordado, de € 4. 858.430,90 (i) a título de lucros cessantes da exploração do kartódromo desde 2007 e (ii) a título de compensação pelo investimento imobiliário realizado.
- A exigibilidade de lucros cessantes, decorrentes da potencial exploração comercial da pista de Karting e da compensação pelo investimento, consta da transação judicial considerada válida por um tribunal, cuja sentença tem a força decorrente dos nºs. 2 e 3 do artigo 205.º da Constituição da República Portuguesa, mas não está claro se tal cálculo do prejuízo a indemnizar teve efetivamente em conta a existência ou inexistência de licenciamento da construção da pista de karting e de autorização da utilização e exploração comercial da pista de karting.
- O artigo 180.º n.º 1 al. b) do Código de Processo dos Tribunais Administrativos prevê a possibilidade de recurso à arbitragem voluntária no âmbito em que ocorreu (cf. ainda o artigo 4.º n.º 1 als. f) e h) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais).
- O processo arbitral e a homologada transação, base da despesa pública aqui em causa, visaram resolver um litígio relativo a indemnizações por danos causados com a confessada ocupação pelas rés RAM e S.D.P.S. de terrenos da autora P.B.E.P. (responsabilidade civil extracontratual de entidades públicas por atos de gestão pública).
- A despesa aqui em causa, que abrange - simultaneamente - uma indemnização por danos extracontratuais (€ 4.858.430,90; cf. os artigos 1.º, 3.º e 7.º do regime da responsabilidade civil extracontratual do estado e demais entidades públicas/2007 e 562.º Seguintes do Código Civil) e o custo da aquisição de um terreno registado em nome da empresa autora (€ 811.769,10; cf. os artigos 874.º e 879.º do Código Civil), está validada pelos âmbitos que efetivamente têm a Resolução governamental existente, o processo contencioso arbitral ocorrido, a transação acordada e a sentença homologatória dessa transação.
- A transparência, a credibilidade e a sindicabilidade das decisões administrativas de despesa pública são mais efetivas quando essas decisões contêm elas próprias a exposição, ainda que sucinta, dos critérios e fatores qualitativos e quantitativos adotados no processo decisório, bem como as ponderações realizadas pela autoridade administrativa ou financeira durante esse processo.
- Não compete a esta Jurisdição aferir da validade da sentença de outro tribunal de outra jurisdição, transitada em julgado e homologatória de uma transação, devendo todas as entidades, tribunais incluídos, respeitar essa sentença por força dos artigos 111.º n.º 1, 205.º n.ºs 2 e 3, 209.º n.º 2, 211.º n.º 1, 212.º n.º 3 e 214.º n.º 1 da Constituição e das disposições legais relativas às impugnações de transações judiciais e de sentenças de tribunais estaduais e arbitrais (cíveis ou administrativos).
- Não se descortina, no caso em apreço, infração financeira.
O Tribunal de Contas recomendou em especial (i) à Secretaria Regional das Finanças da RAM, (ii) à Secretaria Regional dos Equipamentos e Infraestruturas da RAM e (iii) à SDPS, S.A. que, de futuro, fundamentem pormenorizadamente quaisquer acordos de natureza patrimonial e ou financeira negociados com particulares em situações de litígio, exteriorizando essa fundamentação nas próprias decisões administrativas (por exemplo, em resoluções governamentais, portarias, em decisões de Direito administrativo de empresas públicas e em outros atos de administração pública), através da exposição, sucinta mas suficiente, de todos os critérios quantitativos e qualitativos adotados, bem como de todas as ponderações feitas, por forma a que a boa administração do interesse público financeiro fique transparentemente documentada nessas decisões e seja facilmente fiscalizável.
TRANSFERIR TEXTO INTEGRAL
|